Natal, 12/11/2014.
Não, não é que eu não queira entender o que você entende por
família ... não, não é que eu não queira entender o que é uma família ... não,
não é que eu não queira querer entender o que você entende por família, não ...
não ... é!
É que tudo o que se entende deve ser entendido parcialmente,
proporcionalmente ... e tudo que é proporcional proporciona porções de um todo
imaginário, de um todo imaginado, de um tudo inimaginável, um todo de poucos
momentos que se juntam a outros tantos momentos que torna cada momento um único
momento e um momento único ... isso é um tudo em todos os sentidos.
Forçar trazer para a realidade o todo imaginário, o todo
imaginado, é uma tonteria total, uma total intotalidade totalizande de total
infelicidade que nos torna totalmente incompletos: intotais.
Familiarizamo-nos com as famílias de coisas que acontecem
sem que nos permitam com elas nos sentirmos efetivamente familizarizados,
familiamos desejos de sermos família e, assim, órfãos sem família nenhuma,
seguimos tentando sentir familiaridade com o que jamais queríamos nos
familiarizar: a solidão. E, obrigados totalmente pelas circunstâncias totalizantes
de nossos desejos, seguidos familiarizados com as orfandades desesperadoras.
Nosso coração, órgão órfão de tudo, desola-se e se sente desfamiliarizado de si
mesmo e continua, a bater no mundo, única coisa com que se familiarizou a fazer
na vida que bate, bate, bate ... e nos deixa assim: apanhados.
Sim, apanhados porque batidos por corações que só sabem
bater ... apanhados porque nos jogamos na sarjeta imunda de um mundo mudo de
palavras essenciais que dariam a certeza de se poder confiar nas palavras ditas
e entender as palavras mudas que gritam nossos sentimentos de sermos
abandonados – a despeito de sermos, na verdade, abonados – e, despido de
palavras mudas, somos levados por outros corações que batem imundos em seu
próprio universo de solidão e desejam corações já familiarizados com outros
corações que batem mudos.
Somos apanhados de surpresa em filmes que mostram-nos
liberdade e felicidade e nos dão – poucas semanas depois - ostridade.
Tornamo-nos ostras livres em mares mortos e somos obrigados a nos familiarizar
com o sal do mar morto que salga nossa casa de ostra e nos obriga a sermos assim:
pequenos de nós mesmos no ostracismo de querer ser mais familiarizados com a
felicidade imaginária, com a felicidade imaginada, e termos de abdicar de todas
as alegrias com as quais nos familiarizamos a vida toda.
Somos assim, um destodo de vida.
De quando em quando, o sal do mar morto acerta-nos o olho.
Ostra que nos tornamos, passamos a abrir os olhos nesses momentos e vemos o
jardim do qual saímos para nos jogarmos na sarjeta ... queremos novamente sair
do ostracismo e poder sentir a verdade gritando em nossa cara que a alegria
imaginada inexiste, mas existe a vida que imaginamos infeliz no passado, mas
que se mosta desostralizante de nós no presente e isso nos move a sair da sarjeta,
a sair correndo da casa de ostra para beber goles de alegrias que não se
consolidam na carne, mas produzem orgasmos na alma e se traduzem em lágrimas que
brotam dos olhos abertos pelo sal que sorriem ao reviver lares de paredes
escuras e de alegrias escurecidas pelo silêncio de palavras ditas em filmes
mudos ...
Não, não é que eu não queira entender o que o você entende,
entende? Entendo. E, em tendo me familiarizado com tudo e com todos que
silenciaram palavras essenciais e abdicaram de esperar a casa da ostra que me
tornei se abrir para um mundo de alegrias outrora familiares, me volto para o
pequeno para perceber que volto a ser o que me obriguei familiarizado: um
coração que bate no mundo, um deztodo de vida que segue o seco sem sacar que o
destino é seco, ou não. Não, não é...