Natal, 01/04/2016
Queria poder sentir o que não sinto e sinto não poder sem
ti.
Uma esperança que desespera e me faz esperar que o desespero
passe ... e passe tudo isso que não me deixa passar.
Impressiono-me de mim mesmo e me sinto assim, sem ti, sem
mim, sentido.
Muitas vezes esperei e desesperei porque queria não esperar
nada e que nada me desesperasse, mas foi em vão. Vão lá todas as minhas
vontades, todos os meus desejos, todos os meus eus que não queriam viver mesmo
se conseguissem ...
Intenciono não lembrar de mim sem ti, mas sem ti sou eu
mesmo e mesmo sendo o mesmo eu que sempre fui, não me sinto mais o mesmo. Desmesmei-me
de mim mesmo porque me destruí, me destituí de ser o que sempre fui.
Coração que bate no mundo já não bate mais ... respira
sangue da vida que jorra do desespero de não ser sem ti o que sem ti sempre
fui.
Outrora sentia tudo sem ti, mas nada sentia de verdade. Nada
sinto agora, igualmente, mas parece que sem ti tudo ainda me faz sentir que
algo aqui está sem ti, não sei o que.
Também não quero saber, não quero comparar-me aos homens
meus irmãos na terra que sabem ser humanos e por isso desumanos são. Não, não
quero estar assim, triste; assim, cego; assim, tosco; assim ... Ah sim, quero é
estar comigo e pensar que comigo vivo sempre.
Ah ... choro lágrimas de vazios inexistentes em mim
completamente, mas existentes no vazio que me faz eu, assim, triste; assim,
calado; assim, parvo; assim, parco; assim, insuficiente.
Insuficiente por poder pensar que nada sou sem que isso seja
uma verdade absoluta, mas que cria em mim uma absoluta ilusão de não ser.
Meus dias passaram a durar a éter na idade. Éter que, como
um cateter, retém sangue que se faz lágrimas nos olhos secos de vazios de ti.
Antecipo o fim do que não começou porque nem deve começar
fadado que está a não ter início.
Insto-me como um coração cheio de desesperanças e espero que
esta vida não me traga de volta a loucura de sentir algo que não possa
controlar, que não queira controlar, que não seja controlável per se, porque é
de sua essência ser o descontrole.
Loucura. Sim, sim, sim loucura que assola e arranca do peito
o vazio que lhe completa e lhe enche de saudade, de esperança, de desejos, de
impotência ... loucura.
Outrora não era assim, outrora nada era tudo e tudo que se
podia ter e sentir e querer era um corpo para poder preencher-lhes os buracos
que esperavam por prazeres doloridos, que esperavam por músculos duros a arremessar
o desprazer para longe e encher, músculo e saliva, os espaços vagos da solidão
da carne que viva, sentia-se morta.
Negarei sempre que assim estou sem ti: carne morta na vida que
vive.